Resposta ao Tempo
*Publicado no Diário Catarinense em 16/07/2014
Ao juiz da execução penal cabe executar as penas, com base na lei e principalmente na Constituição. Além disso, como corregedor do sistema, cabe-lhe fiscalizar as unidades prisionais, avaliando entre outros a estrutura dos prédios, os recursos humanos e as condições em que se encontram os detentos. Em síntese, cabe-lhe jurisdicionar. É muito difícil a tarefa.
Dentre as pilhas de processos, agora muitos digitais, atendimentos a advogados, familiares de presos, pessoas da comunidade em geral, o juiz deve estar presente no sistema prisional. Ele deve se inserir no universo carcerário, para afirmar o direito e a Justiça. Árdua tarefa desse juiz, cujo peso das dificuldades diariamente se deposita por sobre seus ombros.
Talvez o ponto mais grave entre todas as mazelas brasileiras seja o sistema penal. Diferente de outras áreas também importantes, como a saúde e educação, no sistema penal o Estado age positivamente na violação dos direitos humanos. Primeiro, abandona a vítima à própria sorte. Depois, com base na lei, lança o acusado no sistema degradante do cárcere e logo em seguida esquece esta mesma lei.
O sujeito passa a sobreviver em celas superlotadas, num estado selvagem, de desespero, que só faz recrudescer a violência vivenciada na vida em liberdade. Por isso é preciso jurisdicionar, mesmo que para tanto o juiz da execução penal tenha que se encontrar face à face com dezenas de presos doentes, que se apresentam com feridas abertas e infeccionadas pela escabiose, centenas de presos que passam frio, sem roupas suficientes a enfrentar o rigor invernal, dormindo no chão, sobre espumas, sem produtos de higiene, sem atendimentos médico.
Mesmo que para tanto se tenha que enfrentar a face impiedosa de autoridades públicas, que não desejam que esse holocausto carcerário seja mostrado, dissecado e protestado pela população. O Tempo é mais lento dentro de uma prisão. As horas, os dias, semanas e anos custam a passar. E quando nessa eternidade viola-se a dignidade, o tempo fere, tortura.
O juiz da execução penal pode fazer esse tempo fluir mais rápido e menos cruel, conferindo dignidade humana aos detentos. Cabe-lhe enfim jurisdicionar. Essa sua resposta ao tempo.
João Marcos Buch
Juiz de Direito da Vara de Execuções Penais e Corregedor do Sistema Prisional da Comarca de Joinville/SC